A inserção progressiva da tecnologia nas mediações do cotidiano está promovendo mudanças drásticas nos processos de produção tecnológica. As pessoas estão se apropriando das tecnologias de maneira tão consciente que já não se pode considerar os processos de recepção dissociados dos processos de produção. Faz-se, necessário, portanto, tomar ambos processos numa perspectiva histórica, para que não se percam seus entrelaçamentos e contextos.
A modernidade inaugurou a reprodução em massa de bens de consumo e obras culturais, ampliando a gama de setores sociais a serem incluídos na dinâmica econômica e cultural do comércio. Em tempos tardios, a cultura popular se identifica cada vez mais com a cultura de massa, reivindicando, na mesma medida, a participação em seu espaços e temporalidades. Experimenta-se, neste momento, diferentes formas de formalizar a participação popular na produção de bens e obras culturais.
O barateamento e simplificação e tecnologias para a produção de obras culturais, tais como computadores e câmeras de fotografia e vídeo, estão habilitando os membros da audiência dos meios de comunicação massivos a se tornarem também produtores efetivos. Acompanhando e ampliando o movimento, novos meios de comunicação, como a Internet e a rede de telefonia celular, disponibilizam canais de distribuição das obras, constituindo uma cadeia de reprodução horizontal. Profissionais de diferentes áreas de produção e reprodução de obras culturais discutem o rumo de tais mudanças no contexto da Internet sob a alcunha de “Web 2.0”.
Um dos pontos enfatizados na discussão sobre “Web 2.0” é a chamada “Arquitetura da Participação”, que indica uma estrutura informática preparada para a extensão e recombinação de seus elementos por qualquer um de seus usuários (APIs, código aberto, Web Services, etc). A questão que fica em aberto é como promover a participação popular na criação de tais estruturas. Como modelo de participação, são citados os projetos de Software Livre, que utilizam estas arquiteturas para a produção colaborativa de artefatos tecnológicos. Entretanto, para compreender e usar estas arquiteturas, é necessário um conhecimento técnico elevado, no qual não estão interessados muitos dos usuários dos softwares produzido por meio destas arquiteturas. Alguns projetos procuram superar esta dificuldade incluindo especialistas no comportamento do usuário em suas equipes, enquanto outros experimentam novas ferramentas que facilitem a participação popular.
Na indústria de software, a participação do usuário é historicamente marginal. Apesar de ser considerado referência para o processo de design (“design centrado no usuário”), seu papel não tem poder para interferir no processo diretamente. Mesmo que seja convidado a participar de certas dinâmicas para investigação de seu perfil demográfico, hábitos e contexto sócio-cultural, o usuário é tratado como objeto, não como sujeito de pesquisa. Ele não é considerado capaz de participar do processo de design, por isso, justifica-se a necessidade de especialistas que traduzam o comportamento exibido pelo usuário em determinações para o design. Apesar de hegemônica, esta abordagem não é uníssona no Design de Interação.
Design Participativo, por exemplo, é uma abordagem utilizada há décadas em diversas áreas — do Planejamento Rural ao Planejamento Urbano, passando pela Arquitetura, Design de Produtos e pela própria Engenharia de Software. Implica numa prática em que as pessoas influenciadas pelo que está sendo projetado participem ativamente de suas definições. No Design de Interação, esta abordagem começou a ser utilizada para a arquitetura de sistemas na Escandinávia, nos anos 70. Ampliou sua aplicação quando diversos estudos ligados ao trabalho colaborativo mediado pelo computador (CSCW) passaram a preconizá-lo como forma de tornar as interfaces mais adaptadas para as dinâmicas sociais que são por elas mediadas. A partir dos anos 90, algumas empresas produtoras de tecnologias passaram a incluir o design participativo no seu leque de métodos para a pesquisa e desenvolvimento de produtos.
Uma das vantagens do design participativo é sua capacidade em trazer para negociação múltiplos aspectos de uma mesma situação. Tendo a experiência da vivência real da situação, os participantes podem contribuir com propriedade, enfatizando os aspectos que lhe são cruciais. Como os interesses e vivências são diferenciados para cada pessoa, a negociação é um momento em que uma rica totalidade de visões converge ao debate. O resultado é uma síntese de múltiplas determinações calcadas na realidade, não uma visão idealista do que poderia ser e ainda não é.
No processo de design participativo de um software, a interface é apenas a ponta do iceberg; o tema principal das discussões são as possibilidades de uso do software, ou seja, para que ele servirá, como será apropriado por cada participante, qual será o impacto em suas vidas e etc. Neste sentido, o design participativo pode ser um meio para superar as delimitações de área por produtos (ex: Engenharia de Software, Design de Interfaces, Web Design), que induzem ao foco alienado nas micro-estruturas. Design de interação pela abordagem participativa representa uma das formas de implementar na prática o escopo amplo em que a área se auto-define: projetar interações entre seres-humanos.
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