Visualização espacial da atividade humana

Meu doutorado está chegando na metade e finalmente consegui delinear o que será a minha tese. Foi muito difícil definir o tema, pois estou numa área completamente nova: Arquitetura. Não é Arquitetura da Informação, é Arquitetura de prédio mesmo. O complicado é que não existe um departamento de Arquitetura na minha Universidade (super técnica), então minha pesquisa é realizada numa colaboração entre o depto. de Desenho Industrial e Engenharia Civil.

O vídeo abaixo mostra um dos projetos que desenvolvi na minha pesquisa explorando formas visualizar a atividade humana numa planta baixa (a mãe do wireframe).

Trata-se de uma série de workshops de design participativo com usuários de um novo centro de diagnóstico por resonância magnética. Os usuários são, no caso, os médicos, enfermeiras e radiologistas que vão trabalhar neste centro.

No primeiro workshop notei que havia uma dificuldade para verificar se a planta baixa permitia executar as atividades dos usuários confortavelmente. O problema é que ninguém sabia exatamente todos os detalhes destas atividades. A experiência acumulada de se mover no espaço para executar uma atividade é um tipo de conhecimento tácito: você não consegue explicar, mas você sabe quando precisa fazer.

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Os participantes do workshop tentavam explicar como funcionava suas atividades apontando na planta baixa e arrastando o dedo para simular o movimento do próprio corpo. "Se o paciente começar aqui, então ele vai para lá e depois para cá". Apesar de ser uma forma rápida de expressar a dimensão espacial da atividade, pra co-criar ficava difícil. Depois da simulação, nada ficava registrado na planta baixa e o participante tinha que repetir várias vezes. Também acontecia de entenderem coisas diferentes e raramente alguém continuava a ideia de outro participante.

Na Arquitetura existem vários tipos de diagramas mais abstratos que a planta baixa que poderiam ter sido usados no workshop, mas eles também não são materiais adequados para a co-criação. Veja esse diagrama de fluxo que encontrei numa pesquisa de ponta na área.

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Parece perfeita, mas se você tentar usar num workshop encontrará o seguinte problema: um participante desenha uma etapa no fluxo de trabalho que um outro participante não concorda. Aí o que você faz: apaga, risca, ou desenha por cima? Esse tipo de interação acontece o tempo todo durante os workshops e não é nada fácil de decidir o que fazer. Ao contrário de websites, uma vez que o prédio está construído, é difícil de fazer mudanças, então as pessoas se envolvem muito mais nas negociações. Além disso, uma falha na construção pode pôr em risco a vida dos usuários. Design participativo é muito mais tenso nesse caso do que no projeto que fiz para o meu mestrado.

Então o que eu fiz? Eu criei uma espécie de jogo baseado em fios de tricô em que os caminhos dos usuários são amarrados em cima da planta baixa. Quando há discordância, basta desenrolar o fio e amarrar em outro lugar.

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Teve um grupo de usuários que não quiz jogar o jogo porque eles queriam fazer ajustes na planta baixa também. Não valia à pena traçar os caminhos se a planta baixa tinha problemas. O workshop terminou com uma sessão de rabiscos para uma nova planta baixa, mas eu fiquei com isso na cabeça.

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De volta à prancheta, resolvi desenvolver um software que suportasse ajustes mútuos nessas duas dimensões: a planta baixa e os caminhos do fluxo de trabalho. Hoje em dia, a Arquitetura encontra-se em transição para o paradigma Building Information Modelling (BIM). O velho Autocad está sendo substituido pelo Revit, um programa que além de modelar a geometria do prédio em 3D, ele permite guardar informações dinâmicas. Com isso você pode gerar relatórios instantâneos sobre outros fatores importantes como iluminação, serviços de energia, encanamento e etc.

Eu criei um plugin para o Revit que permite traçar os caminhos do fluxo de trabalho e calcular o tempo gasto para andar de um lado a outro do prédio.

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A proposta é que esse plugin seja usado pelos arquitetos durante os workshops. Infelizmente, a interface do Revit é complicada demais para os usuários operarem diretamente, então eu estou pensando em criar uma versão simplificada desse software. Por enquanto, o que a gente conseguiu fazer aqui é testar com os alunos de Engenharia Civil como seria um projeto usando esse plugin.

Uma coisa interessante aconteceu: os alunos começaram a projetar iterativamente. Tradicionalmente, os arquitetos definem primeiro os requerimentos (o que eles chamam de programa) e depois desenham a planta baixa. A princípio, a planta baixa não deveria mudar muito, mas o fato é que é impossível fazer um programa perfeito porque os requerimentos mudam de acordo com a flutuação econômica, disponibilidade de novas tecnologias, mudanças organizacionais e etc.

Abaixo você vê uma animação com as mudanças progressivas realizadas por um aluno. Note como na medida em que ele traça os fluxos, ele vai fazendo ajustes na planta baixa.

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Eu estou no momento pesquisando como representar outros aspectos do uso de um prédio através da Teoria da Atividade. Teremos outros workshops no futuro com desafios mais amplos.

Fiquei surpreso em descobrir que ninguém havia investigado esse assunto cientificamente na Arquitetura. Pela pouca experiência que tenho na área, me parece que a Arquitetura está muito atrás em relação à Computação e ao Desenho Industrial no quesito adequação às necessidades do usuário. Minha esperança é que tornando da dimensão do uso mais tangível através de visualizações da atividade, os arquitetos e engenheiros perceberão que precisam considerem melhor o uso e que, para fazer isso de forma eficaz, precisam convidar os usuários a participar do projeto.

Você conhece alguém no Brasil fazendo algo similar na Arquitetura? Por favor, me passe o contato da pessoa. Se você quiser saber mais sobre minha pesquisa, veja meu blog em inglês.

Fred van Amstel ([email protected]), 12.12.2012

Veja os coment?rios neste endere?o:
http://www.usabilidoido.com.br/visualizacao_espacial_da_atividade_humana.html