Web 2.0 no Brasil

A Revista Webdesign de Janeiro de 2006 traz uma excelente reportagem sobre Web 2.0 do ponto de vista dos brasileiros que estão antenados no assunto. Ao invés de abordar o assunto como uma evolução de paradigmas tecnológicos, a reportagem mostra que Web 2.0 é muito mais do que isso. Foram entrevistados profissionais como Abel Reis, Cristiano Dias, Fabio Seixas, Márcio Tristão e eu.

Além dessa reportagem, a edição conta com uma boa entrevista com Felipe Memória, autor de Design para a Internet. Vale à pena conferir.

Abaixo publico a entrevista que o jornalista Luis Rocha fez comigo para escrever a reportagem. Na revista foram publicados os melhores trechos.

O "modo perpétuo beta" é o modelo para desenvolvimento na Web 2.0?

Vejo mais o pessoal usar o selo "versão beta" como desculpa para eventuais bugs de sistemas lançados precocemente do que como incentivo para usuários sugerirem modificações no sistema. A proposta do estágio beta não é encontrar bugs. Para isso existem as versões alpha distribuídas anteriormente para os departamentos de qualidade das empresas. A moda de perpétuo beta pegou porque o investimento em Web 2.0 ainda é arriscado demais para custear departamentos de qualidade. Na medida em que o retorno seja comprovado, as empresas vão querer garantir que não haja problemas com seus sistemas e o beta terminará.

Quais são as principais diferenças da Web 2.0, em termos de conceitos e tecnologias, em relação a "Web 1.0"? Quais são as vantagens da Web 2.0?

Não gosto desse nome Web 2.0 porque dá a impressão de que houve uma Web 1.0 anterior. Web 2.0 é um movimento social que discute os fundamentos da rede, não uma versão de software ou de arquitetura de redes e é a primeira vez que isso é feito em público. A Web que temos hoje foi criada pela elite acadêmica e o W3C, que atualiza seus padrões, ainda é constituído por esse pessoal mais os engenheiros das grandes fabricantes de softwares.

A grande vantagem da Web 2.0 é justamente essa: mais poder para o usuário. Ele agora é peça-chave na geração de conteúdo, pode remixar o conteúdo gerado por outros usuários, pode classificar informações como quiser, pode interagir com interfaces mais inteligentes e etc.

Alguns usuários já brincam com toda a atenção que o tema Web 2.0 vem recebendo. Independente do seu sucesso ou não, quais mudanças o conceito e a prática da Web 2.0 trará para o trabalho do webdesigner?

Para fazer Web 2.0, o webdesigner precisará entender muito melhor sua função social. Porque a empresa precisa dessa interface? Como ela se insere em suas estratégias? Quem são as pessoas que vão usá-la? Que impacto a interface tem em suas vidas? O webdesigner 2.0 precisa saber que seu trabalho vai muito além de uma tela de computador.

Podemos considerar as comunidades virtuais como o "mapa da mina" no mercado Web 2.0?

Desde que surgiu a Internet volta e meia alguém diz que o futuro são as comunidades, daí surgem um monte de iniciativas ridículas como fóruns de discussão para "troca de receitas" no site de uma marca de molho de tomate famosa. A idéia do fórum não é ruim, o problema é o lugar onde ele está. Dificilmente uma pessoa será motivada a se transformar num super-usuário (aqueles caras que carregam a comunidade nas costas) se não pode brilhar mais do que a marca do molho. Poderiam ser oferecidos prêmios para compensar, mas será que um brinde vale mais do que ser a estrela de um fórum?

O que motiva as pessoas a participar ativamente de comunidades não é o sentimento altruísta de ajudar o próximo, mas sim o contrário. Numa comunidade virtual, as pessoas podem construir seu alter-ego e vê-lo crescer pouco-a-pouco, seja em número de amigos, figurinhas de comunidades, fãs, posts, coraçõezinhos, gelinhos e etc. É como num RPG, onde você pode escolher todas as características do seu personagem e mostrar aos outros e dizer: "olha que legal quem eu sou e os pontos que ganhei". Entretanto, para ganhar pontos numa comunidade é preciso ajudar outras pessoas, ou seja, para se ajudar é preciso ajudar o próximo!

Então o que está funcionando na Web 2.0 não são as comunidades, mas sim a ampliação de oportunidades para que ilustres desconhecidos brilhem como sempre desejaram.

No artigo "What Is the Web 2.0", Tim O'Reilly aponta que o "SQL é o novo HTML". Podemos considerar o gerenciamento de banco de dados como uma das chaves para o sucesso na Web 2.0?

Gerenciar um enorme banco de dados é fácil, difícil é extrair valor dele. Mais importante do que saber formular uma consulta SQL para retornar dados relevantes é saber como transformá-los em conhecimento. Quando um dado é contextualizado, ele se transforma em informação e quando essa informação é transmitida para alguém, ela pode se transformar em conhecimento. Se isso não acontecer, a informação é inútil.

A folcsonomia do Delicious, por exemplo, permite que as pessoas colem etiquetas (tags) em urls incógnitas, permitindo que se ache ela depois que for jogada numa pilha. A etiqueta contextualiza a url e transforma-a em informação que pode ser recuperada pelo usuário. Além de permitir o acesso às urls, essa informação pode ajudar o usuário a entender seus próprios interesses e costumes manifestados no conjunto de suas etiquetas. Como são poucos os profissionais que se preocupam com a formação desse tipo de conhecimento, talvez tenhamos que esperar por outro movimento que vise tornar a Web mais inteligente...

Na Web 2.0, a idéia do que é conteúdo finalmente vai além do texto?

Enquanto a unidade fundamental da Web for a página, o texto continuará sendo o formato principal de veiculação de informação, assim como nos livros e revistas de onde foi tirada essa metáfora.

A mudança principal no âmbito do conteúdo proposta pela Web 2.0 é sua independência da apresentação original. Através do XML, conteúdos vindos de diferentes fontes podem ser remixados numa nova aplicação, gerando informações que não estavam disponíveis anteriormente. O housingmaps.com, por exemplo, é fruto do cruzamento dos mapas do Google Maps com os anúncios de venda e aluguel de imóveis do craiglist.com.

Qual a importância do AJAX para a Web 2.0?

O Ajax está permitindo fazer as primeiras experimentações para ultrapassar a metáfora de páginas da Web. Graças a ele, o foco está saindo da informação e passando à interação. Os websites podem oferecer agora além do acesso, manipulação e transformação da informação. Esse é um bom caminho para transformar toda esse montaréu de informação que temos disponíveis em conhecimento.

Fred van Amstel ([email protected]), 12.01.2006

Veja os coment?rios neste endere?o:
http://www.usabilidoido.com.br/web_20_no_brasil.html